Cinquentenário da Ordenação episcopal do 1º Bispo de Santarém, Dom António Francisco Marques
Liturgia da Memória de São Francisco de Assis
Santarém, igreja de Santa Clara, 04-10-2025
Um dos aspetos da vida da Igreja é a sua historicidade, a sua Fé aponta à eternidade mas o Evangelho aponta o encontro com Cristo, aqui e agora, no tempo em que se vive. Depois da vinda de Cristo, a existência da Igreja corresponde ao tempo novo da ação do Espírito Santo.
Estamos num dia histórico para a Diocese de Santarém, para esta cidade e também para a Igreja em Portugal. Nesta igreja dedicada a Santa Clara, no dia 4 de outubro de 1975, faz hoje cinquenta anos, o Cardeal-Patriarca de Lisboa, D. António Ribeiro, presidiu à Ordenação episcopal do 1º Bispo da Diocese escalabitana, D. António Francisco Marques.
Não foi por acaso que o dia de São Francisco, 4 de outubro, foi escolhido para a Ordenação do 1º Bispo. Era um franciscano, um discípulo de São Francisco.
O que escutámos na Leitura de São Paulo aos Gálatas (Gal 6,14-18) concretizou-se também em São Francisco; o grande Santo de Assis, de quem celebramos hoje a Memória litúrgica, procurou tanto identificar-se com Nosso Senhor Jesus Cristo que passou a trazer em seu corpo os estigmas de Jesus Crucificado. Para São Francisco, Cristo era o centro do qual parte para chegar a tudo e a todos, aos seus semelhantes, à Igreja, à obra da criação e a ele mesmo. Por Cristo chegou à intimidade de Deus e alargaram-se os seus horizontes.
Mas como é que São Francisco conheceu Cristo? A acessibilidade é a mesma de hoje: o Cristo das páginas do Evangelho que ele escutava e que depois passou também a anunciar como Diácono, assumindo aquela exortação que ainda há poucos dias ouvimos na ordenação dos Diáconos: crê o que lês, ensina o crês e vive o que ensinas.
São Francisco de Assis deixou-se tomar interiormente pela centralidade da Paixão de Cristo, mistério do Amor de Deus celebrado na Eucaristia.Contemplando a Majestade de Cristo glorioso reconhecia que é o mesmo Cristo servo de todos que se humilha ao ponto de morrer na cruz. Assim, São Francisco, assume-se como um dos pequeninos do Evangelho a quem Deus preferencialmente de revela e também como um dos que encontram descanso na oração com Jesus.
São Francisco de Assis foi a referência de espiritualidade e de formação do nosso primeiro Bispo, Dom António Francisco Marques, permitindo-lhe também a identificação com Cristo e o bom testemunho da entrega da vida como bom Pastor.
Irmãos e irmãs, quanto melhor conhecermos São Francisco de Assis, melhor conheceremos quem foi o primeiro Bispo da nossa Diocese. Como afirmou o Cardeal-Patriarca, D. António Ribeiro: “Vamos consagrar um bispo que traz na alma a espiritualidade evangélica da Ordem Franciscana, onde o Santo Padre o foi escolher para o pôr à frente da nova Igreja de Santarém. A presença tutelar de Francisco de Assis está, pois, amplamente afirmada nesta nossa celebração”.
Estamos gratos pela dedicação dos Bispos Diocesanos, D. António Francisco Marques e D. Manuel Pelino Domingues e de todos os Padres, Diáconos e Irmãs Consagradas e Leigos que se dedicaram na missão da Diocese ao longo destes cinquenta anos. Entendo que a continuidade, tem inovações mas há aspetos essenciais do início e do percurso que necessitamos de reavivar.
É necessário assumir o testemunho da centralidade da vida em Cristo. A vida da Diocese, a vida de cada comunidade e a vida de cada cristão, renova-se na medida em que estiver centrada em Cristo. Nosso Senhor Jesus Cristo não apenas como uma referência mas como centro, e a partir d’Ele considerar, amar, avaliar e decidir tudo. O cuidado da vida espiritual que consta no programa para o novo Ano, tem a ver com esta centralidade.
Um segundo propósito: é necessário cuidar da unidade da Igreja Diocesana. Há cinquenta anos, o Cardeal-Patriarca, D. António Ribeiro, lançou nesta igreja o seguinte apelo: “Peço-vos, todavia, que vos mantenhais sempre unidos em volta do vosso bispo, amalgamados num só coração e numa só alma, e dispostos a com ele construir a Santa Igreja de Cristo. Sede uma Igreja viva, dinâmica, missionária, verdadeiramente evangélica”.
Irmãos e irmãs
Para uma Igreja unida, viva, dinâmica, missionáriae verdadeiramente evangélica, é necessário vencer a indiferença e valorizar as propostas de evangelização sem nos fechamos no grupo ou Movimento a que pertencemos. A indiferença está presente nas guerras e conflitos em que a ambição por mais poder leva à desvalorização da pessoa humana. A indiferença é uma doença social e os cristãos por falta de vigilância podem cair nessa atitude nada saudável.
A sinodalidade, como modo de ser Igreja, é precisamente o exercício do encontro em que nos dispomos a vencer a indiferença para escutar os outros e deixarmo-nos incomodar com as suas dificuldades.
Outro aspeto importante para a nossa missão cristã, é a qualidade dos relacionamentos humanos. Não faltam notícias de maus tratos, violências, maus relacionamentos, incapacidade de diálogo. Perante estes registos, os cristãos devem cuidar da sua identidade e qualidade humana contribuindo para o bom ambiente humano com bons relacionamentos, não para serem pessoas superiores mas serem sinal de boa educação e da graça de Deus nas suas vidas. Em todas as dimensões, valências e atividades da Igreja, deve cultivar-se o relacionamento humano com a qualidade que permite crescer em alegria e fraternidade.
A concluir, tenho presente a escuta sinodal em que vários participantes salientaram a necessidade de haver na Diocese uma proposta de formação cristã. Existem propostas de formação para pessoas que exercem ministérios nas paróquias, mas pede-se uma proposta aberta de formação básica.
Sem excluir as possibilidades de um ‘primeiro anúncio’, como acontece com a participação num Curso de Cristandade ou num Curso Alpha, espero e desejo que seja possível, em modo sinodal, uma formação para aprofundar “A natureza e a missão da Igreja, concretizada na Igreja Diocesana”. O convite está também no Evangelho de hoje: “aprendei de Mim que sou manso e humilde de coração”. Nas diversas instâncias de reuniões pastorais, refletiremos acerca das condições para implementar esta proposta.
Entretanto, não podemos deixar de sublinhar o testemunho e o valor social dos Centros sociais paroquias, Cáritas Diocesana, Cáritas paroquiais e grupos sócio caritativos e também das Santas Casas da Misericórdia. É um bem enorme assegurado discretamente por muitas pessoas profissionais e voluntárias. Nosso Senhor Jesus Cristo, Bom Samaritano da humanidade, a todos abençoe na prática do bem. E Nossa Senhora da Conceição nos acompanhe no novo ano pastoral que se inicia. Temos fé, avancemos com esperança.
+ José Traquina