Festa da Apresentação do Senhor

(Primeiros Votos da Irmã Inês Marques Proença)

Lisboa, Igreja de São Mamede, 02-02-2024

Irmãs Servas de Nossa Senhora de Fátima

Candidata à profissão Inês Marques 

Irmãos e irmãs em Cristo

Por iniciativa do Papa São João Paulo II em 1997, este dia 2 de fevereiro, Festa da Apresentação do Senhor, passou a ser considerado o “Dia Mundial da Vida Consagrada”. Esta designação deve-se ao Evangelho proclamado neste dia, como escutámos, em que Maria e José, cumprindo a lei, apresentam o Menino Jesus no Templo, 40 dias depois do seu nascimento, para ser consagrado e pertencer a Deus (cf. Lc 2, 22-40). Sendo pertença de Deus, é resgatado por “um par de rolas ou duas pombinhas”. 

  O ‘Dia dos Consagrados’, expressão simplificada, é na Igreja um dia com especial significado para os religiosos e religiosas que professaram os seus votos de entrega a Deus, vivendo à maneira de Jesus. Esta celebração que estamos a realizar inscreve-se na continuidade; a Congregação das Servas de Nossa Senhora de Fátima escolheram bem este dia por força do especial significado espiritual para a profissão e acolhimento de uma nova Irmã, a Inês Marques, que irá professar.

  A profissão religiosa tem de ser uma afirmação livre, só possível e aceitável como resposta a um chamamento de Deus. É uma resposta vocacional que exprime a identidade da Igreja, povo a Deus consagrado, com uma história de espiritualidade, de vida reencontrada e iluminada pela fé e confiança em Cristo Ressuscitado.

  Na história dos chamamentos de Deus verificamos que existe distinção para cada pessoa chamada. Mas há sinais comuns: na maioria dos casos, os chamamentos são relativamente discretos e a vida da pessoa chamada sofre uma alteração. A força e a decisão de quem é chamado reside na confiança em Deus que chama. 

  Recordemos alguns testemunhos vocacionais. Abraão, em Ur da Caldeia, é o primeiro chamamento histórico de que há registo na Sagrada Escritura: “Deixa a tua terra (…) e vai para aquela que Eu te indicar” (Gn 12,1). Abraão mudou de terra, conheceu outra geografia, mudou a terra do seu coração e Deus acompanhou-o com promessas e alianças que se realizaram.

  Moisés tentou libertar os hebreus do Egipto, não conseguiu e refugiou-se no deserto para estar em segurança e curar a sua frustração. Foi no monte Horeb (Sinai) que Deus se lhe revela e o chama para a missão de voltar ao Egito e libertar os hebreus. Considerando ser uma missão impossível, Moisés não aceitou e procurou justificar-se porque conhecia a dificuldade. Mas Deus não desistiu dele e garante-lhe proximidade: Vai, Eu estarei contigo para libertares o meu povo (cf. Ex 3,11-12).    

  Também o adolescente Samuel, como escutámos na primeira leitura (1 Sm 3, 1-10), ouvia alguém que pronunciava o seu nome, pensava que seria o sacerdote Heli, mas era Deus que o chamava. Samuel correspondeu bem à sua vocação; veio a ser uma grande referência profética entre o povo de Israel.

  Na vila afastada de Nazaré da Galileia, Maria é chamada para ser a Mãe do messias prometido. Um chamamento que não corresponde ao seu plano pessoal de vida. Depois de algum esclarecimento às suas dúvidas, Maria afirmou o seu Sim à vontade de Deus e, vencido o medo do futuro desconhecido, exultou de alegria porque a sua vida se inscrevia no projeto de Deus para bem e salvação do seu povo, conforme estava prometido. 

  Na Apresentação de Jesus, o Evangelho (Lc 2,22-40) refere que Simeão, homem idoso, crente e cheio de esperança, movido pelo Espírito Santo, estava no Templo quando Maria e José se aproximaram. Simeão recebeu Jesus Menino em seus braços. 

   Deus é assim, assume a pequenez e a fragilidade para que o recebamos como se recebe nos braços uma criança. O dom da Fé traduz-se no acolhimento de Jesus nos braços e no coração. Entretanto, Simeão, cheio de alegria e contentamento, está pronto para partir e bendiz a Deus porque os seus olhos “viram a salvação”. Teve olhos e inspiração para ver Aquele Menino e considerar que estava ali a Salvação de Deus. 

  Acerca deste Evangelho da Apresentação, o Papa Francisco comentou: “Como nos faz bem ter o Senhor «nos braços» (Lc 2, 28), à semelhança de Simeão! Não só na mente e no coração, mas também nas mãos, ou seja, em tudo o que fazemos: na oração, no trabalho, à mesa, ao telefone, na escola, com os pobres, por todo o lado. Ter o Senhor nas mãos é o antídoto contra o misticismo isolado e o ativismo desenfreado, porque o encontro real com Jesus endireita tanto os sentimentalistas devotos como os ativistas frenéticos. Viver o encontro com Jesus é o remédio também contra a paralisia da normalidade, abrindo-se ao rebuliço diário da graça. Deixar-se encontrar por Jesus, fazer encontrar Jesus: é o segredo para manter viva a chama da vida espiritual. É o modo para não ser absorvido numa vida asfixiadora, onde prevalecem as queixas, a amargura e as inevitáveis deceções”. (Papa Francisco, homilia na Basílica Vaticana a 02-02-2018)

  Já na sua vida pública, Jesus havia de ensinar que era Ele o novo Templo, o ‘espaço espiritual’ onde encontramos Deus, e partilha connosco essa responsabilidade como vida e missão: os membros da Igreja, especialmente os irmãos e irmãs de ‘vida consagrada’ são chamados a ser e a ver a presença de Deus no mundo. 

  A ‘vida consagrada’ supõe e requer o Amor puro de Jesus, a liberdade interior e a capacidade de escuta, vivido em comunidade. É isso o segredo da vida consagrada. Uma vida entregue por uma causa de bem, suportada pelo alimento diário da palavra e da oração, do trabalho e da partilha.

  Nesta experiência de encontro e caminho com Cristo, o coração alarga-se na virtude e na consideração pelos outros. Deste modo, é continuada a experiência de vida de Jesus. É o apelo da segunda leitura, da Carta de São Paulo aos Romanos (Rm 12, 5-12) onde o Apóstolo, com uma linguagem muito clara, define os bons procedimentos dos cristãos a viverem em comunidade com amor fraterno e partilhando os dons e capacidades desenvolvidas para bem de todos. Uma comunidade assim descrita, onde os egoísmos são superados pela promoção do bem comum, é uma profecia para a sociedade. As irmãs e irmãos de ‘vida consagrada’ não são nem o mal nem o problema do mundo, são antes uma presença ativa de luz, de esperança e de paz.

  Importa reconhecer: a ‘vida consagrada’ é um grande sinal da presença de Deus no mundo. Grandes vocações de ‘vida consagrada’ surgiram em tempos difíceis. O tempo em que vivemos é também um tempo difícil para a possibilidade da ‘vida consagrada’ por dificuldades várias entre as quais a falta de reconhecimento social e cultural do valor desta vocação.    

  A Venerável Luiza Andaluz, em tempos difíceis da primeira vintena do século XX,  demorou tempo a discernir o que Deus queria da sua vida, superou o comodismo e assumiu a missão da própria Igreja na responsabilidade de ensinar e ajudar jovens a crescer com boa formação humana, profissional e espiritual. No carisma de Luiza Andaluz, oração e ação complementam-se num mesmo sim à vontade Deus a favor de muitas pessoas.

  A concluir, a palavra que tenho para a Inês é uma breve citação de Luiza Andaluz: “Coragem e confiança! Coragem para enfrentar com calma e sem desânimos os deveres e as dificuldades de cada dia, confiança para trilhar sem receio o caminho traçado, certas de que Deus é bom, ama-nos, tudo pode e nunca falta a quem n’Ele confia”. (Luiza Andaluz – Retiro de Superioras, 1952).

    + José Traquina

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