Caros irmãos e irmãs em Cristo
A Quaresma é um tempo e um percurso que nos conduzirá à celebração da Páscoa.
Somos convidados a fazer o caminho da vida acompanhando Jesus no seu retiro de
quarenta dias, depois do seu Batismo no rio Jordão e antes de escolher os seus apóstolos,
sendo sujeito a tentações e fazendo opções de fidelidade à vontade do Pai.
Estamos perante uma proposta, uma oportunidade de exercício de espiritualidade
em comunhão com muitos outros cristãos, um tempo privilegiado para escutar da Palavra
de Deus, rezar, fazer revisão de vida, promover reconciliação, solidariedade e justas
opções relativamente à família, à comunidade de referência e ao meio em que vivemos.
É também um tempo para acompanharmos espiritualmente aqueles que em todo o
mundo se preparam para serem batizados na Páscoa. A Igreja, povo de Deus, em caminho
de conversão ficará mais identificada com o seu Senhor para assumir a sua missão de ser
sal e luz de salvação para um mundo melhor.
Cuidar da centralidade de Cristo Pascal
Consideremos a Páscoa do Senhor como a centralidade e o ponto alto da nossa
celebração da fé. É a partir desta centralidade e elevação que se valoriza o tempo que se
segue e o tempo que antecede: a Quaresma. Deste modo, reconhecemos a Páscoa como
desígnio e revelação do amor de Deus na paixão, morte e ressurreição de Cristo, como
centro de toda as celebrações da Igreja, povo de Deus, fonte de renovação e de festa de
todos os que crêem em Cristo e n’Ele confiam.
A Páscoa terá para cada um de nós a graça correspondente à sua preparação.
Assim, preparemo-nos para a celebração pascal, valorizando-a nas nossas vidas. E o
primeiro exercício para cada cristão, é conseguir renunciar a ser o centro de si próprio para
dar a centralidade a Cristo e ao seu Evangelho.
Cuidar da disponibilidade para o caminho a percorrer
Somos convidados a fazer uma peregrinação interior durante quarenta dias. O
início é na quarta-feira de cinzas. É um rito que marca o princípio de uma disponibilidade
pessoal e comunitária para o caminho quaresmal, é bom receber as cinzas deixando cair as
vaidades que nos afastam de Deus e uns dos outros.
Se tivermos idade e saúde, devemos fazer jejum, não por um rigorismo que
deprime mas por exercício que interiormente nos ajuda a aperfeiçoar e ser solidários
sintonizando com aqueles que no mundo passam fome por falta de alimentos. Também
podemos tomar consciência de que no mundo morre muita gente por comer demais. O
jejum é exercício de sabedoria e solidariedade e, ainda mais, pode ajudar-nos a sintonizar
com Cristo itinerante e a tornar presente o seu Reino, tornando-nos mais próximos de
outras pessoas.
“Cuidado, ninguém vos desencaminhe” (Mt 24,4)
O caminho para a Páscoa é um exercício de caminho de libertação do mal.
Podemos fazer jejum do que é pecado, para não nos deixemos enganar: o pecado ofende a
Deus porque prejudica o projeto e o bem que Deus tem para nós. Sugestões de puro
divertimento, fazem-nos desperdiçar o tempo que podia ser uma oportunidade para
estudar, rezar e promover alguma ação favorável a outras pessoas. Uma forma muito real e discreta de amar e nos interessarmo-nos por outras pessoas, é fazer uma oração a rezar por elas, mesmo que estejamos distanciados no espaço. Quando assim fazemos com verdade, fé e verdadeiro amor, experimentamos a harmonia humana de Jesus. Com Ele aprendemos que a oração não uma alienação; cultivar a vida interior, dá-nos capacidade para enfrentar a realidade da vida e dispõe-nos a amar mais e melhor.
“É em tua casa que quero celebrar a Páscoa” (Mt 26,18)
Os cuidados que os apóstolos tiveram quanto à celebração da Páscoa, revela-nos
que Jesus pede intimidade e indica o espaço da casa de um desconhecido como o lugar
escolhido para celebrar a sua Páscoa com os seus discípulos. O facto do evangelista não
revelar o nome do dono da casa, deixa em aberto uma possibilidade catequética: é na casa
de cada de cada um de nós que Jesus quer celebrar a sua Páscoa. Na nossa morada interior,
deve acontecer a Páscoa; a passagem em que Jesus se entrega-se ao Pai e se entrega a nós.
“Evangelizar pelo Cuidado”
É este o objetivo deste ano pastoral na nossa Diocese: “Evangelizar pelo cuidado”.
Que esta Quaresma seja um tempo de “cuidado” em apoiar os jovens na preparação,
organização e participação na Jornada Mundial da Juventude. Seja também uma
oportunidade de conhecer melhor a grande educadora e cuidadora social que foi a
Venerável Luiza Andaluz, referência do nosso ano pastoral.
A Quaresma é um tempo de solidariedade com a promoção de renúncias pessoais
orientadas comunitariamente para situações de declarada necessidade de apoio. No ano
passado a Renúncia quaresmal da nossa Diocese juntou o quantitativo de 24.896,82€
destinados e entregues à Diocese de São Tomé e Príncipe e à Cáritas Portuguesa (para a
apoio aos ucranianos). Este ano, considerando os pedidos que nos chegaram e ouvido o
parecer do Conselho Presbiteral, a Renúncia quaresmal destinar-se-á à Diocese de Gurúè
(Moçambique) e Diocese de Petrolina (Pernambuco – Brasil).
Sem disfarçar os desgostos que mancham a identidade e missão da Igreja, vivamos
a Quaresma na fé e na esperança, com verdade e caridade, fazendo, corrigindo e
promovendo o que deve ser feito para bem de todos e agrado de Deus.
Convosco e com a humilde e corajosa Virgem Maria, Senhora da Piedade, que nos
acompanhará no caminho para Páscoa.
+ José Traquina, Bispo de Santarém